No início de julho, participei de uma cerimonia Nixi Pae na terrinha Nuku Mae Yuxibu, em Imaruí (SC). Assim conheci os txais Yube Nawa e Txana Mashupu, representantes do povo Huni Kuin que estão em uma jornada pelo fortalecimento de sua cultura e tradições. Através do trabalho espiritual que realizam com as medicinas da floresta, como ayahuasca, rapé e sananga, estão levantando fundos para construir uma casa de rezo em seu território e assim manter vivo seu conhecimento ancestral.
Eles vivem na terra indígena do Rio Breu, no Acre, região que observa a chegada de igrejas evangélicas, cujas atividades vem afetando as relações dos povos nativos com suas tradições de raiz. “Em nossa terra indígena nós temos nossos valores, nossa espiritualidade,medicinas, cura com a nossa natureza. As mulheres Huni Kuin também produzem muita arte e artesanato, inspiradas nas medicinas sagradas. infelizmente esses trabalhos não estão tendo muita saída. Por isso também que os evangélicos estão encontrando espaço pra chegar, pois nosso artesanato não tem saída, nossa medicina não tem saída”, conta Yube Nawa.
Pela primeira vez ele e Txana, que aprenderam a servir as medicinas com os anciões da sua aldeia, vieram ao Sul do Brasil, em busca de redes e recursos. Para tal, fizeram uma conexão com Mapu Huni Kuin, cacique, artista e uma das principais lideranças espirituais do Acre, que está a frente de um projeto social que atua para fortalecer a cultura e a espiritualidade de seu povo. O movimento também trabalha pela libertação de terras, que são adquiridas com o propósito de preservar, regenerar e reflorestar – objetivos compartilhados com a comunidade Nuku Mae Yuxibu, em Imaruí.
Além de poder escutar sobre a atual realidade da terra indígena que Txana Mashupu e Yube Nawa habitam, encontrá-los me possibilitou uma valiosa experiencia com a espiritualidade Huni Kuin – algo que as palavras talvez não consigam expressar precisamente. Só posso agradecer pela oportunidade de contato com medicinas a partir de sua raiz, mesmo sem estar na Amazonia.“As plantas com que fazemos nossa ayahuasca são todas nativas, assim como as outras medicinas que trouxemos. Tudo natural e nativo. Elas trazem uma força de conexão ao nosso trabalho”, aponta Txana Mashupu.
Durante a cerimonia, percebi que se eu tivesse me preparado com mais disciplina, com restrição de alimentos e resguardos antes, poderia ter aproveitado ainda melhor a força das medicinas. No dia que voltei a encontrar os txais para conversarmos, eles me falaram mais sobre as dietas sagradas, muito presentes em sua tradição. Txana Mashupu me explicou que as dietas possibilitam maior conexão com o espírito de cada medicina, além de ser uma demonstração de respeito por essas forças.
Para os Huni Kuin, cada planta tem um espírito que a guarda, e eles cantam para chamar esses espíritos quando tomam as medicinas. Também fazem isso durante a dieta do muka, uma batata amazônica sagrada para esse povo – eles também relataram que a dieta do muka é muito especial para estudos, para aprender novas habilidades e se aprimorar. Ao invocar os espíritos de cada planta e medicina, os Huni Kuins abrem passagem para que Yuxibu (o grande Espírito), se manifeste. Desta forma, dietas são bastante recomendadas para quem deseja experiencias mais profundas com os saberes da floresta.
Quando temos oportunidade de conviver, nem que seja somente por alguns momentos, com os povos originários, percebemos que é na simplicidade e na conexão espiritual com a Natureza que reside sua força. Ao valorizar trabalho de com as medicinas da floresta e a arte criada pelos Huni Kuin, podemos colaborar diretamente na preservação desse bem viver e fortalecer as comunidades que resistem nas terras indígenas. Fica o convite aqui para seguir Yube Nawa, Txana Mashupu, e os projeto Huwã Karu Yuxibu e Nuku Mae Yuxibu.
Segura firme! Haux Haux!
Texto e foto – Isadora Mun, jornalista e aprendiz dos saberes nativos desse planeta.
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