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Vozes Negras da Escola Saad: aula aberta fala sobre racismo, preconceito e emociona estudantes e professores

vozes negras na saad
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A iniciativa buscou dar aos estudantes negros e negras um espaço de fala, promovendo o diálogo e o entendimento de temas sociais

Imagem da capa: Fabrício Photos

Uma aula dada pelos próprios alunos. A proposta do momento Vozes Negras foi promover o protagonismo aos estudantes e dar visibilidade à discussão sobre o racismo a partir do ponto de vista de quem o vive na pele: estudantes negros e negras. A ação aconteceu na Escola E.E.M. Maria Corrêa Saad, no dia 08 de dezembro, por iniciativa da professora Luciana Vieira, e contou com o apoio da direção e demais colegas.

“Eu ouvi que meus traços eram feios, eram sujos, que meu cabelo era feio, que a minha cultura é feia, é do diabo. E a primeira vez que eu passei por isso, não tinha nenhum tipo de apoio. Ninguém me perguntou como eu estava me sentindo” Ana Laura Pereira.

“Eu estava voltando do trabalho com a minha bicicleta nova quando tomei um enquadro. Eles me bateram, me xingaram muito, me chamando de ladrão. E o pior de tudo, é que um dos policiais tinha o mesmo tom de pele que o meu. Já apanhei na cara, já cuspiram na minha cara só por causa da cor da minha pele. E isso é algo que eu não desejo pra ninguém”, Marcos Alexandre Honorato da Silva.

“Eu queria muito alisar o meu cabelo, porque eu ouvia que ele era feio. Mas graças a minha mãe, que nunca deixou, hoje eu tenho orgulho, acho ele lindo, cacheado, hidratado. Isso mexe com a autoestima da gente.Anny Vitória de Paula Correia

“Quando você olha para os cargos importantes e bem pagos, você vê mais pretos ou brancos? Quando você olha para os trabalhos que ganham menos, ou que ninguém quer fazer, como o do lixeiro, o da faxineira, você vê mais negros ou brancos? É isso que eu queria dizer pra começar.” Murillo Jesus dos Passos

Esses foram alguns dos relatos ouvidos no pátio da escola, por todos os alunos e professores. Comoções entre aqueles que contavam suas histórias, os que ouviam atentos e aqueles estudantes que falavam somente com o olhar.

Durante todo o dia, o microfone ficou com estudantes negros e negras para que compartilhassem relatos, histórias, mensagens aos colegas. Houveram perguntas da plateia, que fomentaram a construção coletiva sobre o que é o racismo e como as pessoas que sofrem qualquer tipo de discriminação podem se sentir.

“O momento Vozes Negras foi idealizado a partir da necessidade de dar o direito do lugar de fala a quem tem propriedade, a quem tem a narrativa, a quem tem, na sua trajetória, questões a serem resolvidas com a sociedade, questões que precisam de escuta e consciência, diante de um Brasil racista”, explicou a professora Luciana, organizadora do evento. “A partir das aulas de geografia e do Projeto de Vida, trabalhando com autoras como Djamila Ribeiro, Vozes Negras vem com uma acolhida a histórias dos estudantes que estão invisíveis, que estão em silêncio.”

Se inscreveram para o palco Vozes Negras os estudantes:

  • Bianca  Cornélio Gonçalves Paulo
  • Marlon Cristino Pereira
  • Anny Vitória de Paula Correia
  • Ana Laura Pereira
  • Murillo Jesus dos Passos
  • William Richard Pelegrino de Souza
  • Thawany Coelho Meirelles
  • Maria Vitória Machado Lopes
  • Wannda Joseline Rodando de Azevedo
  • Wesley Nazareth Linda Vegas
  • Jady Sofia Kulmann Sena
  • Marcos Alexandre Honorato da Silva
  • Maicon da Silva Ramos

Garopaba também é uma comunidade negra 

O Estado de Santa Catarina era, até o Censo 2010, o estado com menor população negra no país. Ainda assim, Garopaba é um dos 16 municípios de Santa Catarina que contam com Comunidades Quilombolas em seu território, o Quilombo da Aldeia (Campo D’una) e o Quilombo Morro do Fortunato (Macacu). Os dados são do Cadastro Único/2020 e lideranças quilombolas, Movimento Negro e Conselho Estadual da População Afrodescendente. 

O desenvolvimento de Garopaba e região passou pelas mãos negras, não somente na mão de obra escravizada, mas também em sua construção cultural. Uma das histórias que remonta o nome da Praia do Ouvidor, é a da Senhora Santina da Silveira Teixeira, residente na Comunidade do Campo D’ Una, que relatou em entrevista para a pesquisa A presença dos africanos e afrodescendentes em Garopaba e seus arredores

“Seu Manoel Pires dono dos 25 escravos, morador e dono de uma propriedade com um engenho no Ouvidor, plantou um tronco de madeira bem grande no alto do morro na praia e colocou um sino com um badalo. Esse sino era para chamar os negros que estavam trabalhando no Morro da Encantada na plantação da mamona, que era para produção de óleo para iluminação da sua casa. Na hora da janta como era chamado naquele tempo, hoje é almoço, o velho Manoel Pires mandava bater o ouvidor [sino] para chamar os negros para a janta.  

Então, o nome Praia do Ouvidor tem ‘origem’ no sino tocado para chamar os escravos, ou seja, o ‘ouvidor’ era o meio de comunicação entre a ‘Casa Grande’ e os escravos dispersos nas plantações mais distantes.”

Racismo estrutural: uma luta de todas as cores

“Em uma sociedade que tem 57% da população autodeclarada como negra ou parda, o racismo estrutural é claro quando olhamos para os cargos de poder da sociedade e não encontramos representatividade”, explicou, entre outras questões, o professor Flávio Ferreira Luciano.

O racismo estrutural é um tema que muitas pessoas não compreendem, e por esta razão, é tão complexo de ser resolvido. Mas observando os dados é possível compreender que se trata de algo que vem desde a construção da sociedade brasileira – não somente -, há mais de 300 anos, e que exige diálogo e esforços para ser resolvido.

Um, entre muitos exemplos, é o Estudo dos Indicadores Socioeconômicos da População Negra da Grande Florianópolis, publicado em 2012, que traz diversos dados demonstrando a melhoria gradual nos índices de igualdade racial na região. Ainda assim, é possível perceber em todos os aspectos que o racismo estrutural se mostra presente.

O estudo apontou por exemplo que em termos reais, a diferença entre o rendimento mensal domiciliar de negros e não negros oscilou entre R$800 e R$ 1000,00. Ou seja, as famílias pretas geram menos renda. Coincidência? Sabemos que não. É uma questão de oportunidades.

“Não é uma causa somente dos negros e das negras, mas uma causa da humanidade. É preciso que haja reflexão constante e mudança de atitude perante as violências que acontecem”, convida a professora Luciana.

“Quanto mais de vocês, brancos entram nessa luta, que é nossa, menos dos nossos morrem. Porque no Brasil, as pessoas pretas morrem pelo simples fato de serem pretas”,

completa a estudante Ana Laura (13).  

Saberes para aprofundar

Estudos

Igualdade e proteção dos direitos da população negra 

A presença dos africanos e afrodescendentes em Garopaba e seus arredores 

Como colaborar ativamente:

Instituto Oportunidade Brasil  é um projeto que tem o Propósito de aumentar a inclusão de jovens negros em situação de vulnerabilidade social no cenário Educacional, Profissional e Promover ações de Igualdade Racial

Documentário

Por Glaucia Rosa Damazio
Jornalista – Redação Colaborativa EcoLab

Fotos: Fabrício Photos, Glaucia Rosa Damazio e Professor Vavá

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